Tuesday, November 26, 2019

Minha entrevista para a I Jornada Monteiro Lobato

A imagem pode conter: Emerson Tin

ENTREVISTA com Emerson Tin
Emerson Tin falará sobre “A correspondência de Monteiro Lobato como exercício da sociabilidade”, no dia 17 de dezembro de 2019, às 11:20, na I Jornada Monteiro Lobato.
JORNADA: Lembra quando foi seu contato com o gênero carta?
EMERSON: Quando tinha de sete para oito anos, comecei a enviar cartão de Natal para minhas professoras. Lembro-me também de ter me correspondido com algumas pessoas por meio das seções de correspondentes que os gibis publicavam. Eu era um leitor voraz de histórias da turma da Mônica e queria muito manter contato com outros leitores. Também escrevia para amigos no período das férias. Eram meados dos anos 80. Não havia internet, nem e-mail, nem WhatsApp... Nem sempre o telefone era o meio mais satisfatório para manter o contato. Daí a carta aparecia como uma forma menos imediata, mais pausada, para manter o contato com quem estava distante. Cheguei a trocar cartas com amigos até o final dos anos 90, quanto a internet começou a se popularizar, e a facilidade do e-mail substituiu a troca das cartas em papel.
JORNADA: E como se desenvolveu o gosto pela leitura de cartas?
EMERSON: Ao lado do meu gosto por escrever cartas. Ao mesmo tempo, devido a um dos filmes de que mais gosto – As ligações perigosas, de 1988, dirigido por Stephen Frears –, adaptação de um dos meus romances prediletos – Les liaisons dangereuses (1782), de Choderlos de Laclos. Li o romance e assisti ao filme inúmeras vezes. O gosto pela leitura de cartas só fez aumentar. Brinco que a leitura de cartas é uma espécie mais inocente de voyeurismo...
JORNADA: Você vem se dedicando ao estudo do gênero carta há muitos anos. Como foi que o gosto pela leitura do gênero se transformou em objeto de pesquisa?
EMERSON: Creio que isso se tenha dado naturalmente. Chegar ao gênero epistolar e aos autores que estudei no mestrado e no doutorado foi uma coincidência de acasos. No mestrado, estava decidido a estudar algum escritor do século XVII ou XVIII. Sempre gostei de La Rochefoucauld, mas, então, não conseguia enxergar um trabalho de pesquisa a respeito de suas máximas. Gostava bastante de um escritor português contemporâneo a La Rochefoucauld cujo estilo sentencioso muito dele se aproximava. Feliz coincidência: ele também era autor de cartas! Acabei decidindo trabalhar com as Cartas Familiares (1664) de D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666). O estudo dessas cartas me permitiu um mergulho profundo em obras que ditaram as regras para a escrita de cartas, o que resultou na publicação do livro A arte de escrever cartas, em 2005, pela Editora da UNICAMP. Findo o mestrado, estava decidido a continuar no estudo do gênero epistolar, mas queria prosseguir no tempo (havia estudado o gênero até o século XVII). No meio caminho, outra feliz coincidência: a chegada, em 2001, do acervo de Monteiro Lobato à UNICAMP, com centenas de cartas. Era não apenas a oportunidade que tinha de prosseguir no estudo do gênero (do século XVII ao século XX), mas também de trabalhar com documentos originais, já que no mestrado eu havia trabalhado com cartas publicadas em livro. E assim foi: desenvolvi meu doutorado entre os anos de 2003 e 2007 em torno da correspondência ativa de Monteiro Lobato.
JORNADA: Você tem investigado livros que reúnem cartas e também acervos literários que reúnem cartas enquanto fontes primárias. As fontes primárias revelam facetas diferentes das cartas publicadas em livros?
EMERSON: Sim, revelam. A publicação das cartas em livros é sempre o resultado de uma seleção, de uma edição. O próprio Monteiro Lobato, ao iniciar a datilografação das cartas que constituiriam A barca de Gleyre, afirmou que esse processo permitiria que fossem depurados os "gatos", o "bagaço", as "inconveniências". Infelizmente, no caso d'A barca de Gleyre, não dispomos dos originais para fazer o cotejo e descobrir o que foi depurado. No entanto, em relação a outro livro de Lobato, as Cartas de amor, que foram publicadas postumamente, em 1969, é possível notar que alguns elementos foram omitidos ou alterados. Um dos melhores exemplos é o de uma carta em que Lobato, escrevendo a sua então noiva, Purezinha, formula dois enigmas em francês, que apresentam inclusive dois pequeninos desenhos de camundongos. Esses enigmas foram totalmente omitidos da carta publicada em livro, sem nem sequer uma menção a sua existência. O tom da carta, originalmente menos sério devido à elaboração desses enigmas, passa a ser muito mais melancólico na sua forma publicada em livro.
JORNADA: O gênero carta seria um gênero apenas para curiosos e pesquisadores? É um legítimo gênero literário? Como professor, já teve oportunidade de trabalhar com esse gênero?
EMERSON: Se o gênero carta seria apenas para curiosos e pesquisadores? Bom, todo pesquisador é um curioso, caso contrário ele nem sequer faria pesquisa. Todo leitor também é um curioso, caso contrário ele nem sequer leria. Assim, creio que o gênero carta é um gênero literário que satisfaz a curiosidade de leitores e pesquisadores, como qualquer outro gênero literário. É um legítimo gênero literário? A resposta aqui depende da definição que se dê à literatura. Em minha definição de literatura, sim, o gênero carta é um gênero literário. Sim, já tive oportunidade de trabalhar com o gênero carta como professor: não só propondo a leitura de cartas, mas também estimulando sua escrita. É um gênero perfeito para trabalhar com os alunos um sentimento de que muito se fala hoje em dia, mas muito em falta no mercado: a empatia. Isso porque o gênero carta pressupõe um olhar para o outro, um cuidado com o seu interlocutor, algo que, nos tempos eletrônicos em que vivemos, parece-me que desaprendemos.

Thursday, November 07, 2019

Monteiro Lobato: As releituras para o contexto da criança de hoje




No próximo sábado, 9 de novembro, das 9 às 12h, estarei com Pedro Bandeira e Douglas Tufano no evento Literatura 21, promovido pela Editora Moderna, falando sobre Monteiro Lobato, literatura infantil e, certamente, cartas!

Local: Biblioteca Parque Villa-Lobos
Av. Queiroz Filho, 1205
Alto de Pinheiros, São Paulo - SP

Para mais informações e inscrições:
https://sites.google.com/view/literatura21sp/p%C3%A1gina-inicial?fbclid=IwAR2hED88vnrn7nxQxPOFjriSlpf4A37-SweGQkqokefw1w9GyJ_Bvzy9R2g

Tuesday, December 20, 2011

Ler correspondência: (um) modo de fazer

Publico aqui o link para o texto que apresentei em julho, no congresso da ABRALIC: http://www.abralic.org.br/anais/cong2011/AnaisOnline/resumos/TC0374-1.pdf

Sunday, November 22, 2009

Novo fôlego para o romance epistolar

Sob um título intrigante - A sociedade literária e a torta de casca de batata (The Guernsey Literary and Potato Peel Pie Society, no original)-, o romance de Mary Ann Shaffer e Annie Barrows que acaba de ser publicado pela Rocco faz ressurgir das cinzas um gênero que teria sido dado como morto: o do romance epistolar. Aliás, não só o faz ressurgir das cinzas, mas com grandes méritos, o que pode comprovar que, apesar do que tem sido anunciado nas últimas décadas, esse gênero ainda pode ter um grande fôlego.
A narrativa nos conduz a um momento crucial do século XX: o final da 2ª Guerra Mundial. O pano de fundo, a vida de uma escritora iniciante, Juliet Ashton, uma inglesa de seus trinta e poucos anos, que trava uma correspondência assídua com os habitantes de Guernsey, uma das "Ilhas do Canal" da Mancha. A cada carta ou telegrama escrito, vemos a protagonista cada vez mais envolvida nessa rede epistolar - e cada vez mais envolvida com os habitantes da ilha, suas histórias, seus destinos. Paralelamente a isso, Juliet procura um tema para seu novo livro (o terceiro, após uma biografia de Anne Brontë e uma coletânea de artigos que publicara na imprensa durante a Guerra, sob pseudônimo) e vemos, em sua correspondência com seu editor - Sidney Stark, um velho amigo, poderíamos quase dizer, "de infância" -, as idas e vindas dos bastidores de um livro.
Podemos ver, além de tudo isso, as trajetórias de cada uma das personagens - tão bem construídas que chegamos, por vezes, a nos esquecer de que são personagens, de que são ficcionais. Ou seja, talvez nisso resida um dos grandes méritos desse livro: a enorme capacidade que suas autoras tiveram de, em cada uma das cartas, conseguir dar uma voz diferente a cada uma das personagens, numa intrincada polifonia que resgata os melhores autores do gênero.
Trata-se, portanto, de um livro para quem gosta de cartas. E, sobretudo, de um livro para quem gosta de livros (e de todo o universo a sua volta). Referências literárias são constantes: Sêneca, Marco Aurélio, Jonathan Swift, Jane Austen, Oscar Wilde. Mas não há aqui o pedantismo das citações eruditas. Afinal, não podemos nos esquecer de que, se há uma sociedade literária aqui - nascida de forma insólita para salvar alguns dos habitantes das punições dos invasores alemães -, ela convive lado a lado com uma torta de casca de batata...
Assim, Shaffer e Barrows surpreendem seus leitores pela sensibilidade com que abordam temas que são ainda - e certamente serão para sempre - cicatrizes na história da humanidade. Mas o fazem de maneira delicada, sem afastar o leitor menos resistente das páginas do livro. Estão ali os horrores da guerra, contrabalançados, porém, pela astúcia e coragem dos habitantes de Guernsey - sobretudo pela astúcia e coragem de Elizabeth, quase um alter ego de Juliet, como se pode constatar.
Aliás, são as mulheres que dominam o livro: Anne Brontë, Elizabeth, Juliet, Amelia, Isola, Kit, até mesmo a antipática Adelaide Addison (senhorita). Já se disse que o gênero epistolar seria um gênero feminino. Estaria aqui mais uma prova?
Por fim, um comentário bem pessoal: A sociedade literária e a torta de casca de batata foi, para mim, daqueles livros difíceis de deixar de lado para me dedicar a outras tarefas. Por outro lado, foi daqueles livros que, da metade para diante, fui lendo cada vez mais devagar, com aquela certeza de que, infelizmente, irremediavelmente, ele chegaria ao fim. Ao final da leitura, a última certeza: a de que estava diante de um grande romance.

Para saber mais sobre as autoras:

Monday, August 31, 2009

Ainda a Teresa

Finalmente, tenho em mãos um exemplar da última edição da revista Teresa, da USP, dedicada à epistolografia.
Depois que puser os olhos, calma e cuidadosamente, sobre a revista, com a calma e o cuidado que uma empreitada da importância e do fôlego dela merece, voltarei a esse blog para expor as minhas impressões.
Até lá, sempre que possível, uma ou outra linha sobre o mundo das cartas!

Thursday, August 20, 2009

D. Francisco Manuel de Melo

Transcrevo abaixo uma das minhas cartas prediletas de D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666), escritor português cuja correspondência foi meu objeto de pesquisa no mestrado.
(Cent. I, Carta 16.ª )
A Luís Martins de Sousa. De bons anos e resposta de negócio.

Estando hoje para me entrar na liteira me deram um papel de V. M. Não podia ser melhor o anúncio de que me espera bom ano, que começando ele, lembrando-se V. M. de mi. Se assi foram bons como são muitos os nossos anos, bem nos pudéramos mandar destes presentes. Mas em verdade aqueles que se gastam, como V. M. gastou os seus, nunca são muitos e nunca são passados. Tristes de esses a quem a idade só serue de peso e não de doutrina, porque a estes, dá-lhes a dor e tira-lhes a experiência. Dias há que nos enganam dizendo-nos que estes dias não são de negócio, mas eu vejo que sim são, e falem por mi os negócios que se têm feito nestes dias. Contudo sou de parecer que este negócio de V. M. o fazê-lo é acertá-lo; e o acertá-lo é fazê-lo a tempo. O primeiro que eu tiuer liure, irei logo oferecê-lo a V. M., cuja pessoa guarde Nosso Senhor como desejo. Ao Reuerendissimo me encomendo muito e muito a minha encomenda. Castelo, o primeiro do ano.

D. F. M.

Wednesday, August 19, 2009

Novidade












Acaba de ser publicada a nova edição da Teresa - Revista de Literatura Brasileira, uma publicação da Pós-Graduação de Literatura Brasileira da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP - http://www.fflch.usp.br/dlcv/revistas.html). Os números 8/9 da revista são dedicados às cartas e publicados em coedição pela USP, Editora 34 e Imprensa Oficial.
Vale a pena dar uma olhada sobre a atual produção acadêmica acerca do gênero epistolar. Como o exemplar que comprei ainda não chegou, não tenho como falar mais a respeito da edição, o que devo fazer numa das próximas postagens.
Mais informações no endereço: http://www.editora34.com.br/detalhe.asp?id=531